sábado, 16 de abril de 2016

Dias!!!


Já se passaram muitos dias. Por exemplo: há muitos dias que não escrevo para o blogue, que tem andado totalmente parado. Há muitos dias que não vejo certos amigos ou que não falo com eles. Há mais de 730 dias que estou em casa. Há quase 730 dias que soube que tinha um cancro. Há mais de 365 dias que fiz o transplante. Há precisamente 365 dias saiu a notícia sobre mim no Jornal de Lafões.

Hoje, relendo essa notícia, sinto que tenho muito mais a dizer que aquelas palavras, e que tantas vezes me falta a coragem, a paciência ou o tempo para me sentar a escrever sobre esse assunto.

Deparei comigo a tremer quando li uma palavra: CANCRO. É verdade que já lá vão quase dois anos que descobri que tinha um cancro, um ano depois do transplante e quase um ano que soube que a doença estava em remissão total. Contudo, a palavra cancro ainda me assusta um pouco. Não que eu tenha medo dela, é só uma palavra, ou daquilo que ela simboliza. Mas assusta-me o mal, o tanto mal que ela tem feito e que na minha vida se tem tornado relevante. Sempre que ouço que este ou aquele tem cancro ou morreu dele, sinto que uma parte grande de mim se entristece. Ainda não há muito tempo, fui ao funeral do irmão de um grande amigo e mestre. Senti que uma parte de mim se enlutava completamente. Não há palavras, não há sorrisos possíveis, mesmo que muito me esforce.

Tenho-me deparado com vários casos de cancro: um amigo a lutar contra um, outro no pós transplante. Uma amiga que neste momento está em Coimbra no transplante, outra que ainda luta contra o cancro, um amigo e companheiro que está quase quase a ir para o transplante. É claro que não são só tristezas. Alegra-me vê-los a vencerem o maldito caranguejo, a retomarem as suas vidas, a serem pessoas melhores.

Mas ainda receio essa palavra. Ainda tremo quando a ouço. Mas que fazer? Viver com medo dela? Para quê?

Relembro algumas palavras que disse naquela altura, e que ainda hoje são tão verdade para mim como o sol nascer todos os dias e iluminar os nossos dias. A vida é para ser vivida, aproveitada. Independentemente de termos uma doença, uma deficiência qualquer. Se o aproveitar os dias está ao nosso alcance, porque não o fazer?

Existem dias muito importantes na nossa vida. Dias menos bons! Há datas que nunca vamos esquecer. Aos meus 25 anos, não me lembro de tudo o que fiz, de tudo o que disse, por onde andei ou passei. Tenho memórias, flashes de acontecimentos. Mas os últimos dois anos não serão esquecidos. Lembro-me de todos os dias, todos os momentos que passei, todas as horas que chorei. A vida são sorrisos, e é isso que importa. Se a morte me mete medo? Não! E no dia em que ela chegar por esta ou aquela razão, quero ser recordado com sorrisos, que as pessoas que se lembrarem de mim, se lembrem daquele rapaz que não deixava de sorrir, mesmo quando o coração chorava.

Mas agora, apesar da chuva, vou aproveitar o dia ao máximo! Sejam Felizes e não deixem de viver! Um grande beijo e abraço e até um futuro breve! E não se esqueçam que há sempre Estórias no meio da História!!!

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Sentar-me em frente ao computador e escrever nem sempre é fácil. As palavras têm de fluir, os dedos pressionarem as teclas com rapidez. A inspiração nem sempre vem, por este ou aquele motivo, e escrever por escrever, há muito quem escreva.

No passado sábado (seis de fevereiro 2016) fiquei a saber que um conterrâneo meu se encontrava a fazer um auto-transplante. Já tinha ouvido falar sobre o seu caso, mas não imaginava que ele já tinha passado pelo meu blogue, lido alguns dos meus muitos disparates e encontrado conforto neles. Pediram-me que lhe escrevesse umas palavrinhas. A verdade é que já me tinha sentado em frente ao computador, mas ainda não havia conseguido escrever nada. Mas de hoje não podia passar. Por isso, estas palavras são para ti, de quem não nomearei o nome, mas que saberá que são para ele.

Bem, caro colega/amigo/companheiro/lutador/vencedor, não te vou contar como foi a minha história do auto-transplante, porque para além de a já ter relatado mil vezes, quer aqui quer em outras redes sociais, tu também estás a passar por isso. Mas vou tecer alguns comentários.
Espero que a comida aí seja melhor que aquela a que tive direito em Coimbra: era sempre igual, sem sal, sabia tudo ao mesmo… Espero mesmo que a tua seja bem melhor, pois não a dava a comer a ninguém. Ainda estás fechado do mundo, num quarto onde já conheces todas as paredes, de cor e salteado, com a mesma vista todos os dias? É bom, não é? Eu amei! Era o meu mundinho onde ninguém podia entrar. Bem, falando a verdade, foi uma tortura. Mas já pediste a televisão por cabo? Se não, pede urgentemente, porque os canais públicos estão pela hora da morte.
E gelados? Têm-te dado gelados? Sabe tão bem… Estás a ver aquela posta à Mirandesa, que decerto deves gostar, ou aquela feijoada tão boa que se come cá fora? O gelado representa isso tudo, mas num mundo onde toda a comidinha é horrível.

Bem, falando de coisas melhores. Como está isso a correr? Bem, espero que muito bem. As enfermeiras são muito chatas? Faz tudo ao contrário do que elas te disserem, porque assim mandam-te embora mais rápido! Ou não!

Ora, já te deves ter perguntado como será a tua vida depois de saíres de aí. Vou-te dar a escolher: queres a vertente boa ou má? Afinal não te vou dar a escolher, porque eu só sei ver a parte boa das coisas. Sabias que vais ter imenso tempo livre? Está aí a chegar a primavera, vais poder acompanhar o desabrochar da primavera. Espero que já tenhas mandado comprar vários livros ou revistas, porque vais passar a ler muito e a ouvir muita música. E tempo com a família? Vais conseguir restabelecer todo o tempo perdido. Lembras-te quando te diziam que não passavas tempo nenhum com eles? Agora até se vão fartar de ti e depois vais ter o teu tempinho precioso. E sabes que mais? Vens um homem novo, com novas células. Não te esqueças de por inveja aos outros com isso. Filas de supermercado, hospital e afins? Acabaram! Vais descobrir que a tua melhor amiga vai ser a máscara verde, ou azul, não importa. Olha, ela vai dar-te free pass em todas as filas. E se as pessoas não te deixarem passar, aproveitas a fama horrível do coitado. Comigo resultou. Chegava de máscara e se não me deixavam passar à frente eu dizia sempre: “Desculpe, mas será que me pode atender o mais rápido possível? É que eu fiz um tratamento e não posso estar muito exposto a grandes aglomerados de gente.” E passava à frente… ahahah. Ah sem falar que vais ser o "carequinha" mais cobiçado da nossa cidade!

Bem, brincadeiras à parte. Espero que esteja mesmo tudo a correr pelo melhor. Esta será a última etapa. Tem fé nisso. Não te deixes ir abaixo. Vive intensamente todos os momentos que de agora em diante vais ter. Eles vão mostrar-te como a vida é bela. Sei que vais ter algumas restrições, mas não te deixes abater por elas. Vê sempre o seu lado positivo, pois vais ser tão in que não vais ter tempo para coisas más. Se precisares de alguma coisa, tens muita gente a quem recorrer, e eu serei um desses. Não desanimes por os dias parecerem longos de mais. Aproveita para fazeres aquelas coisas que há muito tens adiado. Aproveita os momentos com a família e com os amigos. Se eles não te compreenderem, manda dois berros para o ar. Eles vão passar a compreender. Se não, compreende-os tu a eles: eles não sabem o que é ser in, nem a figura mais importante do mundo, nem o que é ter um dia com 24 horas. Sei que me vais entender.


Rapagão, isso aí sempre a correr bem. Deste lado estou a rezar e a torcer por ti! Vem rápido que São Pedro está a bombar, sim? Até um dia destes companheiro!